- Você é linda.
Sorri. Não porque concordava, mas simplesmente porque não tinha o que responder.
- Você é linda, mesmo.
- É, um filósofo acabou de me dizer isso...
Me aconcheguei mais no seu colo, de forma que ele entendesse que o silêncio estava agradável.
- Você é muito apaixonável.
- Oi?
- É, apaixonável. É muito fácil as pessoas se apaixonarem por você.
Ele citou os motivos fofos e meigos pelos quais me considerava apaixonável. Quando acabou, sugeri que fossemos embora.
- Vamos fazer alguma coisa amanhã?
- Ah... pode ser.
- Eu te ligo umas seis, tudo bem?
- Não, Cá... eu te ligo, é melhor.
E eu não liguei. Não dei notícias, não atendi o celular ou respondi as mensagens. Estava claro para mim que estávamos em sintonias diferentes. Ele não era mais o cabeludo que eu conheci no meio da rua. Agora ele tinha nome, sobrenome, profissão e me enaltecia.
Enaltecimento que eu não estava pronta para corresponder.
Talvez ele tenha querido ser fofo, talvez ele tenha achado que eu gostaria de ouvir tais coisas... Não sei, não quis descobrir. Preferi a alternativa mais fácil: não vê-lo mais.
Agindo dessa forma, acabei me tornando aquela pessoa que nunca quis ser. Aquela pessoa que desencana e some. Sem notícias, sem esclarecimentos... nada. Simplesmente desapareci.
Embora tenha consciência do motivo pelo qual eu sumi, ele não sabe. Houve a inversão do papel que eu ocupava atualmente: o pequeno desencanou, sem explicação; agora, eu quem desencanava, e quem ficou sem explicação foi o cabeludo.
Confesso que quando me vi ocupando aquele espaço que não era meu, me senti mal. Logo eu, que tento ser tão sincera e jogar limpo com todos, não estava fazendo isso.
Em outro momento da minha vida, eu certamente me derreteria por tudo que ele me disse. Teria virado água, dado cambalhota e continuaria a vê-lo por valorizar o que ele havia me dito. Até tentaria me forçar a gostar dele. Pouco tempo depois, eu perceberia que não estava dando certo e começaria um "distanciamento progressivo", mas de maneira que pudesse contatá-lo no futuro caso estivesse com vontade de vê-lo (leia-se: carente).
Acontece que minha nova atitude me fez pensar. Eu fui sincera quando iludi ao outro porque gostava do que ele sentia por mim? Eu fui sincera quando desapareci sem dar notícias?
Em ambos os casos a resposta é negativa.
Se na primeira situação eu só pensei em mim e agi movida pela necessidade de afeto, na segunda eu novamente só pensei no meu bem estar e preferi não tentar entender o que aconteceu. Nos dois casos, alguém se magoou. Nos dois casos, alguém ficou sem explicação. E, nos dois casos, quem passou por tudo isso não foi eu.
Não é meu egocentrismo exacerbado que me incomoda. O que mexe comigo é o tamanho da minha hipocrisia em exigir sinceridade do outro quando eu não agi dessa maneira.
Como querer uma satisfação do pequeno pelo seu sumiço se eu não fiz isso para o cabeludo?
Embora eu tenha tido uma visão diferente da situação agindo assim, não é meu direito esperar uma resposta diferente do pequeno se me comportei igual a ele. Querendo ou não, é necessário que pensemos em nossas experiências de vida antes de fazer algo que pode prejudicar ao outro. Pena eu não ter descoberto isso antes de ter mordido o cabeludo e tê-lo mandado passear.
(Em tempo: algumas semanas depois, resolvi ligar para o cabeludo para me sentir melhor. Ele te atendeu? A mim, não.
É... acho que minha tentativa de reparação não deu muito certo...)
Acontece que minha nova atitude me fez pensar. Eu fui sincera quando iludi ao outro porque gostava do que ele sentia por mim? Eu fui sincera quando desapareci sem dar notícias?
Em ambos os casos a resposta é negativa.
Se na primeira situação eu só pensei em mim e agi movida pela necessidade de afeto, na segunda eu novamente só pensei no meu bem estar e preferi não tentar entender o que aconteceu. Nos dois casos, alguém se magoou. Nos dois casos, alguém ficou sem explicação. E, nos dois casos, quem passou por tudo isso não foi eu.
Não é meu egocentrismo exacerbado que me incomoda. O que mexe comigo é o tamanho da minha hipocrisia em exigir sinceridade do outro quando eu não agi dessa maneira.
Como querer uma satisfação do pequeno pelo seu sumiço se eu não fiz isso para o cabeludo?
Embora eu tenha tido uma visão diferente da situação agindo assim, não é meu direito esperar uma resposta diferente do pequeno se me comportei igual a ele. Querendo ou não, é necessário que pensemos em nossas experiências de vida antes de fazer algo que pode prejudicar ao outro. Pena eu não ter descoberto isso antes de ter mordido o cabeludo e tê-lo mandado passear.
(Em tempo: algumas semanas depois, resolvi ligar para o cabeludo para me sentir melhor. Ele te atendeu? A mim, não.
É... acho que minha tentativa de reparação não deu muito certo...)